Doenças da retina

Doenças da retina 2021-02-02T11:30:11-04:00

Retinopatia diabética

A retinopatia diabética constitui doença vascular da retina que, por seu caráter crônico e progressivo, é importante causa de cegueira da humanidade. A patogênese da retinopatia diabética envolve a isquemia retiniana, que estimula a produção de fatores angiogênicos, induzindo a formação patológica de novos vasos (neovascularização) (Stephan & Brock, 1996; Michaelson, 1948; Ashton, 1957). Os neovasos de retina podem crescer sobre o vítreo, formando pontes fibrovasculares, que posteriormente podem contrair-se e ocasionar hemorragias e descolamento de retina tracional, que caracterizam estágios avançados da retinopatia diabética proliferativa (RDP) (Aiello et al., 1998; Kohner, 1993; Garner, 1981; Porta & Bandello, 2002).

A retinopatia diabética decorre de uma microangiopatia que afeta as arteríolas pré-capilares, capilares e vênulas retinianas. Contudo, vasos maiores podem também estar envolvidos (Kohner, 1993). Fatores relacionados à gravidade do acometimento retiniano incluem tempo de doença, níveis glicêmicos e de hemoglobina glicosilada, níveis tensionais e tabagismo (DCCT Research Group, 1993; Mulhauser et al., 1986; UKPDS, 1998).

As alterações da retinopatia diabética proliferativa levam a hemorragias vítreas severas e/ou descolamento de retina, podendo levar a total perda da visão (ausência de percepção luminosa). Além disso, fenômenos exsudativos e isquêmicos são causas importantes de baixa visão, podendo ocasionar edema macular e isquemia macular respectivamente.

O tratamento convencional da retinopatia diabética proliferativa, principalmente ao atingir-se o estágio de alto risco, é tradicionalmente baseado na fotocoagulação de retina a LASER, entretanto o tratamento com inibidores da angiogênese intravítreos, como o ranibizumabe, bevacizumabe e aflibercepte, aparece como nova modalidade de tratamento da retinopatia diabética proliferativa. O edema macular diabético também têm se beneficiado do tratamento com farmacoterapia intraocular, além da fotocoagulação a LASER. Casos mais avançados de retinopatia diabética , com descolamento de retina  ou hemorragia vítrea, podem se beneficiar da cirurgia de vitrectomia posterior.

Retinopatia da prematuridade

A retinopatia da prematuridade (ROP) é uma doença vasoproliferativa da retina de etiologia multifatorial na qual a vasculogênese da retina incompleta favorece a formação de tecido neovascular.  A melhoria dos níveis de desenvolvimento socioeconômico, associada à disponibilidade e melhor qualidade dos cuidados de saúde, tem permitido a sobrevida de recém-nascidos pré-termo (RNPT) cada vez menores, com isso, tornando frequente a ocorrência da morbidade. A ROP é umas das principais causas de cegueira preveníveis na infância, sendo responsável por 50000 crianças cegas em todo mundo. Entretanto, a identificação precoce da lesão retiniana e a instituição do tratamento adequado podem evitar a cegueira.

Em cerca de 85% dos pacientes afectados, o crescimento de tecido neovascular induzido por isquemia sofre involução espontânea, enquanto que no restante dos pacientes a proliferação fibrovascular progride para o vítreo, indicando, assim, a necessidade de tratamento (16 ).

De acordo com as Diretrizes Brasileiras para a Triagem e Tratamento da ROP, de 2007, todos os recém-nascidos prematuros com peso de nascimento de 1.500 g ou menos e/ou com uma idade gestacional de 32 semanas ou menos, ou que têm fatores de risco para desenvolvimento de ROP, devem ser examinados entre a quarta e a sexta semana de vida por um oftalmologista experiente no exame de prematuros para ROP, com o objetivo de identificar os casos, acompanhar e, se necessário, tratar esses pacientes.

Assim, apesar do potencial de cegueira da ROP, avaliação adequada com mapeamento de retina e pronto tratamento, quando indicado, podem reduzir significativamente o impacto da retinopatia como causa de bixa visão.

Degeneração macular relacionada à idade

A degeneração macular relacionada à idade (DMRI) é a principal responsável por casos de cegueira irreversível em indivíduos com mais de 50 anos em países desenvolvidos, com tendência a aumento de sua prevalência nos próximos anos.

Pode ser classificada em duas formas principais: seca e exsudativa ou úmida. A forma seca é mais freqüente, ocorrendo em 80% dos casos de DMRI e se caracteriza pela presença de drusas, áreas de alteração da pigmentação do epitélio pigmentado da retina (EPR) e atrofia do EPR e coriocapilar, indo desde fases iniciais com poucas drusas até quadros mais avançados com atrofia geográfica envolvendo o centro da fóvea. A forma exsudativa ocorre em 20% dos casos de DMRI, mas pode ser responsável por quase 90% dos casos de perda grave da acuidade visual (20/200 ou pior) relacionada à DMRI, e se caracteriza pela presença de membrana neovascular sub-retiniana, definindo também um estágio avançado da doença.

A DMRI apresenta mecanismo patogênico multifatorial, sendo reconhecidos como principais fatores de risco idade avançada, etnia e genética. Outros fatores também são implicados, como o tabagismo, principal fator modificável associado, e aspectos da dieta.

As manifestações clínicas da DMRI vão desde uma discreta diminuição da acuidade visual e metamorfopsia até grave perda da visão central. A avaliação com biomicroscopia de fundo de olho é fundamental para identificação de aspectos sutis relacionados à presença de lesão neovascular de coróide, como presença de espessamento retiniano, áreas de hemorragia e descolamento do epitélio pigmentado. Além da biomicroscopia de fundo de olho, retinografia, angiografia fluoresceínica e com indocianina verde, tomografia de coerência óptica (OCT) e, mais recentemente, angioOCT são úteis no diagnóstico e acompanhamento dos casos.

O tratamento da DMRI apresentou uma grande evolução desde a última década, principalmente em se considerando a forma neovascular. Com relação à forma seca, benefícios são apontados com uso de altas doses de vitaminas e micronutrientes cuja prescrição é geralmente recomendada para casos de DMRI seca intermediária em um ou ambos os olhos ou avançada em um olho. A luteína e zeaxantina são pigmentos maculares que, quando consumidos na forma de suplementação vitamínica, podem aumentar a densidade da pigmentação macular (MOPD, macular optical density) e atuar como “filtro” contra os efeitos deletérios da luz sobre o epitélio pigmentado e fotorreceptores,

Com relação à forma neovascular, a evolução se deu a partir de um tratamento destrutivo objetivando a eliminação direta da lesão neovascular pela fotocoagulação a LASER no padrão estudado no Macular Photocoagulation Study, passando pela terapia fotodinâmica com verteporfina (PDT), em 2000, até o surgimento de métodos de tratamento mais seletivos direcionado aos fatores que induzem a perda visual com menor dano às estruturas oculares, como o fator de crescimento vascular endotelial (VEGF).

Atualmente, o uso intravítreo de drogas antiVEGF se constitui a primeira linha de tratamento e estabilização da DMRI exsudativa, sendo utilizados o ranibizumabe, aflibercepte e o bevacizumabe, este último em caráter off label. O ranibizumabe e o bevacizumabe parecem ter efeito semelhante quando administrados mensalmente, podendo-se ter resultado inferior, em longo prazo, na aplicação conforme a necessidade (pro re nata) particularmente para o bevacizumabe. O aflibercepte possui a vantagem de, após três aplicações mensais, poder ser administrado a cada dois meses com resultados semelhantes ao ranibizumabe mensal. Entretanto, na prática diária, o que se busca é uma estratégia de tratamento e acompanhamento que minimize o impacto da doença na vida do paciente, mantendo os bons resultados dos estudos clínicos porém com menor número de avaliações e injeções.

Desta forma, reconhece-se que grandes avanços foram conseguidos no manejo e tratamento da DMRI, principalmente na forma exsudativa, podendo diminuir o impacto da doença como causa de cegueira. Entretanto, deve-se garantir o diagnóstico precoce e aderência ao tratamento com métodos adequados individualmente conforme as características do paciente e da lesão ocular. Alternativas para o futuro do tratamento da DMRI neovascular podem incluir tratamentos combinados a fim de diminuir a freqüência de injeções intravítreas de antiangiogênicos, sistemas de liberação prolongada de drogas e terapia gênica, além dos métodos de reabilitação dos indivíduos com grave perda visual.

Uveítes

Uveítes posteriores

As uveítes posteriores são inflamações oculares que envolvem primariamente a retina ou coróide, ou ambas, podendo estar também o vítreo envolvido.

O quadro clínico dos pacientes com uveíte posterior é variável, dependendo da localização da lesão coriorretiniana, extensão da doença e etiologia do processo inflamatório. Em geral, o paciente se apresenta com olho aparentemente calmo e com queixa de moscas volantes, diminuição da acuidade visual, alterações do campo visual e metamorfopsia. O exame oftalmológico pode revelar lesões de retinite ou coroidite, com padrão focal, multi-focal ou difuso, e envolvimento vítreo, com celularidade vítrea.

A etiologia das uveítes posteriores pode ser infecciosa ou não infecciosa. Dentre as causas infecciosas, apontam-se a tuberculose, toxoplasmose, sífilis, toxocaríase, vírus (citomegalovírus, herpes vírus, rubéola), além das endoftalmites fúngicas e bacterianas. Considerando-se as etiologias dos processos não infecciosos, encontram-se sarcoidose, oftalmia simpática, doença de Vogt-Koyanagi-Harada, doença de Behçet, síndromes dos pontos brancos e coriorretinopatias secundárias a doenças vasculares do colágeno.

O diagnóstico das causas de uveítes posteriores envolve uma anamnese adequada com questionamento sobre doenças sistêmicas que podem ser responsáveis pelo processo inflamatório ocular. As características da lesão ocular podem também sugerir a etiologia, como no caso de um granuloma do pólo posterior na toxocaríase ou de uma retinocoroidite focal próximo a uma lesão antiga no caso da toxoplasmose. Assim, faz-se necessário o exame oftalmoscópico binocular indireto com biomicroscopia de fundo de olho. Exames que também auxiliam no diagnóstico são a angiografia fluoresceínica e a ecografia ocular, esta última principalmente nos casos de difícil de visualização do segmento posterior. Biópsia de vítreo pode ajudar a esclarecer o diagnóstico em casos difíceis.

Outros exames complementares podem ser solicitados de acordo com a etiologia suspeitada, como radiografia de tórax, sorologia para doenças infecciosas, dosagem de enzima conversora da angiotensina sérica, PPD e provas reumatológicas, entre outros.

O tratamento das uveítes posteriores inclui o tratamento da doença de base com medicação específica e o uso de drogas para controlar o processo inflamatório intraocular.

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